Disrupção do trabalho, tornando-o híbrido, pode gerar mais estresse

“Estresse é uma reação não específica do organismo frente a qualquer mudança”

Endocrinologista, primeiro pesquisador científico sobre os mecanismos do estresse

Gostaria de fazer uma primeira abordagem a partir da definição de estresse criada pelo Dr. Selye.

Não importa a mudança, nosso organismo reage a ela e responde de forma autônoma, sem nenhuma possibilidade de controle. Afinal, o que desencadeia o processo é o sistema límbico sobre o qual não temos nenhum controle.

Por outro lado, sempre digo que, se não fosse o estresse, ainda estaríamos por inventar a roda.  

Portanto, à primeira vista, podemos dizer que o estresse é positivo, pois seu mecanismo nos impulsiona à autopreservação, bem como na busca de nossos sonhos.

A grande questão que tornou o estresse como o mal deste século, conforme descrição da OMS, não foi o estresse em si, mas a nossa cultura que desencadeia este mecanismo de forma muito mais intensa e frequente do que nossos ancestrais da caverna.

A segunda premissa que gostaria de estabelecer para a reflexão dos leitores é que esta nova forma híbrida de trabalho presencial e remoto no home office que está se estabelecendo, traz, à primeira vista, benefícios incríveis, muitos deles há anos apontados pelo sociólogo italiano Domenico De Masi.

Em vasta literatura, De Masi explora os benefícios e a falta de lógica nos deslocamentos desnecessários resultando em estresse, congestionamento, gasto energético e poluição, entre outros fatores que impactam negativamente os trabalhadores e as cidades. (“O futuro do Trabalho”, Editora UnB | José Olympio Editora, Rio de Janeiro, 2001).

Não temos como deixar de reconhecer que não ter que passarmos diariamente em horas de trânsito, seja dentro do seu próprio carro ou no transporte público, é um ponto a favor do home office.

A flexibilização do horário de trabalho acaba gerando melhores resultados, tanto para a empresa como para os colaboradores, que podem gerir seu dia a dia mais adequadamente, além de poder trabalhar em locais alternativos e até mesmo em outras cidades, o que proporciona um maior sentimento de independência e liberdade.

No entanto, em enquete que realizei pelo LinkedIn, com aproximadamente 100 pessoas, tanto os que declaravam seu nível de estresse, como os líderes que avaliavam suas equipes, apontaram que cerca de 32% dos participantes estavam extremamente mais estressados ou muito mais estressados do que antes do trabalho remoto.

Prefiro olhar o copo meio vazio, pois ter 32% de pessoas estressadas ou à beira de um Burnout é um número suficiente para desestimular este grupo, além de criar um peso adicional para àqueles que estão se sentindo melhor com o trabalho remoto. Não podemos também esquecer de eventuais passivos trabalhistas em cima de uma legislação desatualizada, que, entretanto, ainda está em vigor.

Recente estudo desenvolvido pela Microsoft ao redor do mundo sugere que devemos agir rapidamente em cima do aprendizado dos últimos doze meses e que não adianta ficarmos questionando se vamos voltar ou não ao antigo normal. A disrupção já ocorreu.

Pesquisas realizadas com 30.000 pessoas em 31 países tem consistência em mostrar que há um processo disruptivo e sem retorno.

Entretanto, de acordo com a Dra. Mary Donohue, fundadora do Centro de Bem-Estar Digital, a exaustão que estamos sentindo pode ser atribuída à velocidade e urgência do trabalho virtual. Conversas presenciais dão ao nosso cérebro a chance de avaliar melhor as coisas. O tom da voz e a linguagem corporal podem ajudar as coisas a fazerem mais sentido. Por sua vez, a tecnologia criou o que se chama “estática digital”, ou seja, “a lacuna entre o que você tenta comunicar on-line e o que a pessoa que recebe a mensagem entende”. À medida que essa estática digital aumenta, a fadiga e a ansiedade dos colaboradores também aumentam, bem como as taxas de Burnout, diminuindo a motivação e o engajamento.

Acabo de facilitar um workshop on-line sobre “Gerenciamento de estresse no Home Office” em que afirmo que não irá aparecer um ET para lhe ajudar com seu estresse e que, apesar das empresas terem parte da responsabilidade sobre o estresse provocado, cada um de nós deve ser responsável pelo gerenciamento – insisto, não controle – de seu estresse.

Dentro deste trabalho proponho identificar os fatores de estresse e dar um mergulho dentro de si, avaliando o ambiente no home office, rotinas, interrupções, comunicação, influência da família, atitudes e reações, o que torna essencial para traçar um plano de gerenciamento, processo que pode exigir uma ajuda multiprofissional. Após esta avaliação e planejamento é fundamental o monitoramento das metas e mudanças, pois, caso contrário, acabamos focando no que é urgente e deixamos de fora o que é mais importante, nossa saúde e nossa qualidade de vida.

Finalizando, fica a dica da Dra. Donohue:  “Para evitar o Burnout, o Dr. Albert Einstein deitava-se em uma banheira e observava as bolhas. Ninguém podia falar com ele. Ele estava pensando e observando as bolhas”.

Segundo a Dra. Donohue, “Para reduzir o risco de Burnout, tenha alguns minutos todos os dias para ficar quieto. Mesmo três minutos por dia podem fazer a diferença”. É o que chamo de fazer um “Stressbreak”, conceito que desenvolvi nos anos 2000.

Emerson Ciocioroswki

Criador da marca Stressbreak® desenvolve programas sobre gerenciamento de estresse

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